Powered By Blogger

sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010

Camex autoriza retaliação a produtos dos EUA


O Conselho de Ministros da Câmara de Comércio Exterior (Camex) autorizou a retaliação aos Estados Unidos em até US$ 560 milhões em produtos, em face da decisão da Organização Mundial do Comércio (OMC), que permitiu ao Brasil aplicar uma retaliação comercial no valor total aproximado de US$ 800 milhões. O Conselho aprovou uma listagem prévia de produtos selecionados que poderão ter aumento do imposto de importação em até 100 pontos percentuais. A lista definitiva dos bens será divulgada em março.

O governo brasileiro estuda, ainda, retaliar a diferença de valores em direitos propriedade intelectual ou serviços (chamada de retaliação cruzada), já que os árbitros da OMC determinaram que o Brasil não precisa limitar a retaliação ao comércio de bens.

O direito do Brasil de retaliar produtos norte-americanos decorre das práticas comerciais protecionistas consideradas contrárias às normas estabelecidas pela OMC. Os subsídios à produção e à exportação de algodão, proibidos e acionáveis, aplicados pelos EUA foram condenados pelo Órgão de Solução de Controvérsias, em face dos prejuízos causados à indústria brasileira.

A disputa entre os dois países na OMC durou nove anos. O Brasil iniciou a reclamação em 2002, com pedido de consultas (WT/DS267/1), questionando os subsídios concedidos pelos Estados Unidos à produção e à exportação de algodão no período de 1999 a 2002, da ordem de US$12,5 bilhões, com fundamento no Acordo sobre Subsídios e Medidas Compensatórias da OMC.

O Grupo Especial (Panel) e o Órgão de Apelação consideraram que três programas de garantias de crédito à exportação (GSM 102, GSM 103 e SCGP) configuravam subsídios proibidos à exportação, aplicados de forma incompatível com os compromissos assumidos pelos EUA no Acordo sobre Agricultura da OMC e no Acordo sobre Subsídios e Medidas Compensatórias, não somente com relação ao algodão mas a um conjunto mais amplo de produtos agrícolas. Decidiu-se que os EUA deveriam retirar os subsídios “sem demora, e não mais tarde que 1o de julho de 2005”.

Com relação aos subsídios acionáveis, o Grupo Especial (Panel) e o Órgão de Apelação consideraram que três programas de apoio interno norte-americanos (“Marketing Loan”, “Counter-Cyclical Payments” e “Step 2”) causaram prejuízos graves ao Brasil, tendo gerado supressão significativa dos preços do algodão no mercado internacional, em violação ao Acordo sobre Subsídios e Medidas Compensatórias da OMC. Em razão disso, decidiu-se que os EUA deveriam “remover os efeitos adversos causados por esses subsídios, ou retirar os subsídios, até 21 de setembro de 2005”. O programa “Step 2” também foi condenado como subsídio proibido e, somente a partir de 1º de agosto de 2006, os subsídios ao programa foram eliminados pelos EUA, em obediência acordos comerciais ratificados.

Desde as primeiras disputas perante o Órgão de Solução de Controvérsias da OMC, esta é a primeira vez que o Brasil aplica as medidas de retaliação. No caso entre Brasil e Canadá referente aos subsídios à exportação de aeronaves, por exemplo, o Brasil preferiu não retaliar. Ressalta-se, entretanto, que na disputa entre Embraer X Bombardier tanto o Brasil quanto o Canadá foram condenados por praticar subsídios contrários ao Acordo sobre Subsídios e Medidas Compensatórias. Assim, ambos tiveram autorização do Órgão de Solução de Controvérsias para adotar medidas compensatórias (retaliações).

A possibilidade de os EUA quererem contrarretaliar é colocar em xeque todo o sistema de solução de controvérsias da OMC, e “desdentar” o órgão conhecido pelo poder que tem. Além disso, o próprio sistema permite que tanto os países desenvolvidos quanto os em desenvolvimento e menos desenvolvidos possam se valer de um tribunal para dar soluções às controvérsias comerciais de modo mais equitativo. Se os países industrializados não cumprirem as decisões contrárias aos seus interesses e resolverem cumprir apenas as que lhes concederem benefícios, de que adianta levar os litígios para serem apreciados e julgados perante um tribunal? A prática de ilícitos internacionais decorrentes do não cumprimento das obrigações assumidas em tratados internacionais enseja a responsabilização dos Estados por violação ao princípio da pacta sunt servanda.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Quem sou eu

Minha foto
Professora-adjunta de Direito Internacional da Faculdade de Direito da Universidade de Brasília (UnB). Ex-coordenadora Geral de Cooperação Jurídica Internacional do DRCI do Ministério da Justiça.